No dia 3 de julho de 2018 a APDA – Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas – foi confrontada com a informação de que o Ministério da Saúde, através da Direção-Geral da Saúde (DGS), iria assinar no dia 4 de julho de 2018 um protocolo com a Associação Portuguesa dos Industriais de Águas Minerais Naturais e de Nascente (APIAM), tendo em vista o lançamento de uma campanha, digital e televisiva, para o consumo de água como parte de uma vida e alimentação saudável, conceitos e princípios com os quais a APDA não poderia estar mais de acordo.
Não pretendendo fazer juízos antecipados à campanha e à intervenção privilegiada da APIAM com a DGS, a APDA aguardou pela disponibilização cabal da informação para se pronunciar sobre a mesma e, com base nos elementos de que dispõe, considera de essencial importância assinalar e sublinhar as lacunas e incongruências de uma iniciativa que pretenderia ser promotora do consumo da Água sem setorizações e intuitos comerciais.
Assim:
1. A APDA verifica que a campanha tem um claro enfoque na água engarrafada em embalagens de plástico do tipo comercial. Consideramos que esta mensagem é contrária à persistente promoção e sensibilização para o consumo da água da torneira, como a água mais segura, completa e adequada como bem alimentar, saudável e ambientalmente sustentável para o consumo humano.
A campanha do Ministério da Saúde ignora, assim, de uma vez só, pelo menos dois tipos de esforços continuados de há vários anos por parte do Ministério do Ambiente, Entidades Gestoras e Municípios, Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos e demais Stakeholders relevantes do setor da Água e do Ambiente, como é o caso da APDA.
Está, aliás, em preparação, o lançamento de uma campanha dirigida ao reforço do consumo da água da torneira e á sensibilização para a adoção de boas práticas de “poupança” e de “uso eficiente e sustentável da água”, por parte de entidades do Ministério do Ambiente/ Águas de Portugal.
2. A campanha do Ministério da Saúde/ Direção-Geral da Saúde coloca de lado o conceito de “água da torneira”, como “a água para consumo humano”, água segura (99% segundo a ERSAR), ao mesmo tempo que dá palco ao “plástico”, cujo uso indiscriminado e descontrolado vem provocando sérios danos em praticamente todos os setores, incluindo os recursos hídricos e os serviços de água.
Não se compreende, portanto, como num País de referência no que respeita à qualidade da água da torneira, que apresenta valores de excelência neste indicadores, vem uma entidade estatal, contrariando as mensagens de outra entidade estatal, pertencente ao mesmo Governo, patrocinar uma campanha de água engarrafada que, não só não é melhor e mais adequada para “o consumo humano”, como tem associada uma pesada “pegada ecológica”, para além de um custo/m3 fortemente mais elevado.
3. A APDA, sendo a representante nacional das Entidades Gestoras de Águas e por inerência representante da “água da torneira”, nunca foi contactada para participar nesta campanha, apropriando-se a DGS e a APIAM desse tipo de comunicação sobre água da torneira, ignorando-a e associando, de forma mais ou menos subliminar, a água a outros tipos de bebidas e, portanto, à sua aquisição em embalagens engarrafadas.
De referir que a APIAM, quando confrontada com uma campanha de promoção da “água da torneira” em 2008, ativou os dispositivos legais ao seu dispor, para a inviabilizar com a retirada da Campanha dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento de Oeiras e Amadora do espaço público, invocando motivos de valorização enganosa da qualidade da água, critérios de análise que podemos facilmente encontrar nesta intervenção dez anos depois.
4. Esta posição do Ministério da Saúde/ Direção-Geral da Saúde entra em contradição com posições e formas de atuar do Ministério com a pasta do Ambiente, provocando uma situação incompreensível de um Estado que transmite ao País, aos Setores da Água e da Saúde e à Sociedade em geral mensagens contrárias (quando não, opostas) sobre um tema tão sensível e da maior relevância para a promoção dos direitos e da qualidade de vida dos cidadãos. De facto, trata-se de promover práticas que, inclusive, contradizem os objetivos pretendidos pelos avultados investimentos realizados por diversos Governos ao nível das infraestruturas e da garantia da qualidade da água, sensibilização e educação ambiental e adaptação e minimização dos efeitos das alterações climáticas.
Estas preocupações estão, aliás, patentes nas visões da Comissão Europeia e Parlamento Europeu, em documentos como a revisão da Diretiva da Água para Consumo Humano, em curso, ou a Estratégia dos Plásticos.
5. A APDA recomenda à Direção-Geral da Saúde que olhe para o seu passado recente e para os seus arquivos, onde encontrará uma campanha de 2011, lançada pelo Diretor-Geral, na altura Francisco George, que promovia, explicitamente, o consumo de água da torneira afirmando a sua segurança e total adequação para o consumo humano, eliminando o risco de a população servida com água da torneira poder vir a contrair doenças veiculadas por via hídrica.
A APDA demonstra assim o seu profundo desagrado com a campanha da Direção-Geral da Saúde com a APIAM, por esta manifestar mensagens discrepantes com muitos dos objetivos nacionais e europeus, cujos conteúdos, a nosso ver, não se adequam à proteção da saúde, economia e do ambiente do nosso País.
Lisboa, 6 de julho de 2018
O Conselho Diretivo da APDA